Um monumento à Ibiapaba
Atualizado em: 01/06/2009

É impossível aos que passam pela frente desta obra prima e cartão postal de Tianguá, não se admirar com tamanha beleza e imponência. Personagem presente dos tempos antigos e modernos em nossa cidade, a catedral de Nossa Senhora de Santana assistiu a todos os acontecimentos históricos e rotineiros de Tianguá. É ícone presente na vida de todos os tianguaenses, simbolizando e servindo como marco material deste sentimento tão forte que é o de ser filho desta terra.
Construída a partir de uma capela preexistente formada por estrutura de taipa e telhado de palha, erguida pelo Capitão português João Batista Leal, nossa Igreja Matriz ganhou suas primeiras formas arquitetônicas como a torre-mor e os torreões laterais, com a reforma empreendida pelo filho ilustre tianguaense Monsenhor Dr. Agesilau de Aguiar, pároco da época.
Em 1958, o então vigário Padre Tibúrcio Gonçalves, realizou a reforma que extinguiria as formas singelas de uma capela e tornaria nossa igreja uma obra ímpar na Serra da Ibiapaba. Com arquitetura inspirada em prédios como o Palácio do Instituto Osvaldo Cruz, no Rio de Janeiro e o Palácio de Alhambra, um dos mais belos exemplos da arquitetura árabe em todo o mundo, a Catedral de Nossa Senhora Santana enche de orgulho todas as gerações de filhos desta cidade.

O arquiteto Raimundo Nonato Reis, utilizou em seu projeto, marcas inconfundíveis da arquitetura moura do período medieval em Portugal, a qual trouxe aos olhos tianguaenses a harmonia dos traços, envolvendo cristianismo e islamismo em um símbolo que nos remete a um profundo sentimento de paz.
Nossa igreja matriz, assim como tantas outras no Brasil, foi o marco inicial do desenvolvimento de Tianguá. Aos seus arredores foram sendo construídas as primeiras residências de nossa cidade, onde no quadrilátero mais próximo do templo eram estabelecidas as moradias de pessoas com mais posses e influência, consequentemente deixando as propriedades mais distantes às pessoas mais humildes. Uma característica que diferenciou o desenvolvimento de Tianguá dos demais, foi a forma de expansão. Enquanto outras cidades cresciam desordenadamente, com ruas estreitas e sem nenhum planejamento, Tianguá crescia de forma ordenada, apesar de não possuir um planejamento oficial. A cidade foi ganhando uma forma ordenada, com ruas retilíneas e cruzamentos formando uma espécie de tabuleiro de xadrex, modelo que até hoje tem sido adotado.
Site ::Tianguá Esperto::
Serra da Ibiapaba é um enclave verde em meio à paisagem sertaneja
Atualizado em 07/02/2009

Praticar paraglider em Viçosa, além de uma boa dose de adrenalina, é também um colírio
Apesar de dividirem o Ceará do Piauí, as paisagens da Serra da Ibiapaba passam longe dos mandacarus e xique-xiques do sertão nordestino. Os 110 quilômetros de serra, com altitudes que vão de 800 a 1100 metros, se espalham pelo extremo oeste do estado e oferecem atividades daquelas que consagraram o turismo cearense.
Viçosa do Ceará: cultura, ecoturismo e boa comida
Esta foi a primeira cidade fundada na serra, em 1700, por índios tabajaras e padres jesuítas, no contexto das missões evangelizadoras que vinham da metrópole portuguesa para o Brasil.
A principal vocação do destino é o ecoturismo. Você pode curtir as belezas do lugar - que se dividem entre fontes naturais e uma flora exuberante - percorrendo as trilhas ecológicas, cruzando os roteiros de motocross e também do alto, voando de paraglider.
Se estiver por lá nos primeiros dias de maio, não perca o festival Mel, Chorinho e Cachaça, que está em suas primeiras edições, mas já faz o maior sucesso. O evento é uma boa oportunidade de experimentar as delícias da região que, além daquelas que dão nome ao festival, também incluem licores, biscoitos artesanais e doces.
Se quiser levar os quitutes da serra para casa, procure pela Casa dos Licores.
Ubajara: o menor Parque Nacional do país:
A gruta de Ubajara é possivelmente a principal singularidade de cidade que lhe deu nome. Ela é formada por rochas calcáreas, cuja erosão foi responsável pela profusão de formas e cores que podemos ver em seu interior.
O acesso à caverna é possivelmente tão atraente quanto ela: o teleférico que vence os quase quatro quilômetros de trilha até lá presenteia os visitantes com uma vista privilegiada da Mata Atlântica.
Nos meses mais secos - outubro e novembro -, os mirantes de Ubajara oferecem, do alto de seus quase mil metros, uma visão impressionante do sertão cearense.
Tianguá
O forte de Tianguá são suas cachoeiras, que podem ser fonte de banhos revigorantes. Visitar as quedas d'água e bicas naturais que escorrem pelos Paredões de Janeiro, corredor composto de formações rochosas, é uma boa maneira de começar a exploração das belezas que a cidade guarda.
A cachoeira de São Gonçalo também é imperdível: um conjunto de quedas divide espaço com um caminho de águas que engloba também a fauna e flora do lugar. A nove quilômetros da sede fica a trilha da Transumância, que refaz o caminho que percorriam os colonizadores. É margeado por alambiques e engenhos.
Rochas de chapada do Ceará contam lenda de amor proibido
Atualizado em: 29/12/2008
Pedras impressionam pela semelhança com animais e figuras humanas.
Novecentos metros acima do nível do mar, formação das rochas é diferente.
A beleza natural das rochas e montanhas da Chapada de Ibiapaba, no Ceará, atrai turistas e moradores da região por seus mistérios e lendas. Em Guaraciaba do Norte (CE), as pedras impressionam pela semelhança com animais e figuras humanas talhadas com o passar dos anos.
Já na cidade de Tianguá (CE), as formações rochosas são encontradas dentro da cidade e, segundo estudiosos, a área representa um pouco da história da região.“Essa região foi muito usada, há algumas décadas, dentro de um corredor onde os caçadores atuavam. Eles usavam o local para se reabastecer com seus animais”, afirma Amaury Pinto, professor de história.
Por estar cerca de 900 metros acima do nível do mar, as rochas do planalto do Ibiapaba são diferentes de outras formações rochosas do Ceará. “A grande maioria das pedras do estado tem formação cristalina e, em Ibiapaba, elas têm formação sedimentar, ou seja, as rochas são formadas em camadas sobrepostas umas às outras”, diz o geólogo Cláudio Souza.
Em Viçosa do Ceará (CE), as pedras do chamado Castelo de Pedras, segundo a lenda local, representam letras que contam a história de um amor proibido. “Segundo a lenda, o local já foi um povoado indígena e, no processo de catequização, quando os jesuítas aqui vieram, um deles teria se apaixonado por uma índia. Eles tiveram um romance proibido e Deus, em forma de castigo, desceu sobre o local e transformou tudo em pedras “, afirma a educadora ambiental Francivan Vieira.
O Extermínio do índios do Ceará e da Ibiapaba

Índios Tabajaras em ritual canibal.
Pelos vestígios humanos encontrados nas regiões de Pacujá, Alcântara, Cariré, Crateús, Sobral, Ipu e Serra da Ibiapaba, o “Sia-rá” era habitado há milênios por povos não evoluídos e que viviam migrando de um lugar para outro, alimentando-se de raízes, da caça e da pesca. Andavam nus e usavam sobre o corpo pinturas estranhas como símbolo da sua cultura. Os índios do litoral viviam em constante atrito com os índios do sertão disputando território e alimentos (caça, frutos e legumes...).
Os povos do alto sertão viviam mais isolados que os do litoral e, portanto, eram mais bárbaros e falavam línguas estranhas, que eram completamente desconhecidas mesmo aos índios tupi de todo o litoral do País. Apesar de bravos, os índios do sertão eram incomparáveis as Tribos bravias da até então desconhecida Serra da Ibiapaba, considerada uma muralha inviolável e perigosa que abrigava entre outras tribos, os Tremembés e Tabajaras.
Até a chegada do homem branco as guerras ocorriam entre as tribos e entre elas adotava-se o bizarro costume de o vencedor aprisionar e devorar o guerreiro derrotado. Quase todas as Tribos adotavam um ritual simples: o guerreiro derrotado era tratado como um marajá durante meses. Comia do bom e do melhor e dormia com a mais bela índia da tribo. Quando o guerreiro estava gordo e psicologicamente satisfeito e feliz chegava a hora do abate e da grande festa na Tribo. O prisioneiro abatido era esquartejado e sua carne era distribuída obedecendo o seguinte ritual: os guerreiros machos ficavam com as coxas e os braços, os velhos com os intestinos, os jovens mancebos (adolescentes) com as costelas e as mãos, e as jovens índias solteiras com o pênis e os bagos (testículos) para atrair a fertilidade no matrimônio. O destino da cabeça era objeto de decoração na aldeia, fincada numa estaca, exposta ao tempo como prova da bravura e coragem daquela tribo.
Por volta do século XVII, quando portugueses, franceses e holandeses intensificaram as disputas por terras e poder, colonos e piratas eram despejados nas terras dos nativos para se apossarem das terras áridas do Sia-rá.
Sentindo o perigo se aproximar os índios decidiram abandonar as lutas entre si e formar uma confederação indígena para defender seus territórios. A confederação dos bárbaros contava com a participação dos índios do litoral, dos Tapuias, dos Canindés, dos Cara-tius, Quixelôs, dos Rerius, dos Ipus, dos Ararius e dos Inhamuns. As tribos bravias da Serra da Ibiapaba estavam de fora de confederação por que nenhuma tribo ousava escalar a grande muralha da Serra Grande para negociar com as tribos que viviam “dentro da neblina e perto do Céu” como diziam as tribos do sertão.
A Confederação indígena era grande, mas os povos do litoral avaliaram que sem a participação dos bárbaros que habitavam a Muralha as chances de vencer os invasores, bem equipados de espadas e armas de fogos eram pequenas. Com muita cautela decidiram cortejar as Tribos bravias da Muralha Grande se aproximando pela encosta do Ipu onde a tribo nativa de lá, por está mais próximo dos bárbaros, teria mais chances de subir a Serra para tratar do assunto. Deu tudo certo. Consciente do perigo que todos os nativos passavam os “habitantes da neblina” juntamente com as Tribos do sertão combinaram o dia do ataque ao inimigo.
Como uma horda de “demônios” os nativos da temida Muralha desceram a Serra arrastando consigo as outras Tribos da Confederação e por onde passavam, matavam, queimava e destruíam as Fazendas de cana e de gado dos recém-instalados colonos portugueses às margens Rio das Garças (hoje, Rio Acarau) e do Rio Jaguar (hoje, Rio Jaguaribe). Não ficou pedra sobre pedra. A situação para os brancos ficou desesperadora, a ponto do império português incentivar uma fuga em massa de todos os seus contingentes. Mas os colonos sobreviventes e mais teimosos acharam por bem não fugir dando-se por derrotados e preferiram armarem-se de forma mais ofensiva e aumentar o número de homens para poderem resistir e depois exterminar os bárbaros. A história logo registraria que a idéia de permanecer nas terras do Sia-rá não era muito boa. Logo aconteceu o que se temia: a onda bárbara desceu novamente a Serra e percorreu os sertões, incendiando, saqueando, destruindo, matando qualquer estranho que estava no caminho. Dezenas de povoados fundados por brancos ou por mamelucos caíram ante a ação dos “selvagens”. Os brancos abatidos viraram churrascos nos banquetes dos selvagens e deram origem a vários pratos exóticos: português na brasa; português ao molho; português apimentado e seco ao sol; miúdos de português cozidos, etc.
Derrotados de forma bárbara o império de Portugal resolve organizar um exército de índios mansos de São Paulo, de mamelucos e de soldados bem treinados. A ordem era matar sem piedade os “comedores de gente”. Com armas modernas: espada, carabinas e canhões, o exército comandado pelo império português marchou para a região com sede de vingança. A guerra durou décadas mas a vantagem das armas dos europeus fazia a diferença nos combates, e aos poucos, os índios das planícies do sertão foram caçados como feras, escravizados e exterminados de forma impiedosa. Os índios mais jovens e fortes foram vendidos aos colonos dos povoados de Sobral, Fortaleza e Maranguape. O destino das mulheres variavam conforme a idade. Se fosse idosa era destinada a imediata execução; se fosse jovem e sexualmente atraente, prestava-se como escrava sexual de uma horda de “homem-fera”. Uma índia pré-adolescente ou adolescente era estuprada numa seqüência por 30 homens depois vendidas como escravas. As crianças pequenas eram abandonadas no mato para morrer de fome.
Exterminados as tribos do sertão, restava as bravias Tribos da Ibiapaba que na sua trincheira natural metia medo aos exércitos mais bem treinados. A estratégia foi mandar buscar mais armas e gente em São Paulo já que subir a Serra sem o máximo de tecnologia armamentista era uma espécie de suicídio. Somente quando chegou o reforço de armas e de homens foi que se iniciou a escalada invasora da Ibiapaba pelo trecho do Ipu. No primeiro momento de confronto, as tropas leais à coroa portuguesa depararam-se com a feroz resistência dos bárbaros ao ponto do Capitão Mor bradar: “ Os animais estão em vantagem, recuar todos”. A posição dos índios era muita estratégica. Pelas duas laterais e pelo centro da bica do Ipu, numa altura de 150 metros os índios com ampla visão do inimigo descarregaram suas certeiras flexas, causando uma enorme baixa nas fileiras inimigas. Quando atacaram por outro flanco os portugueses se depararam com uma milenar escadaria esculpida no próprio paredão repleta de selvagens espreitados a espera do inimigo. Centenas de homens brancos morreram num curto espaço de tempo, a ponto de muitos combatentes do exército invasor baterem em retirada.
Mas o exército da coroa portuguesa insistiu confiando nos estragos dos canhões e das suas carabinas. De fato aquelas armas estrondosas e cuspindo fogo causaram um forte impacto psicológico nos índios com efeito de intimidar os selvagens. Com a vantagem da tecnologia os invasores foram abrindo espaço e reduzindo a resistência das bravas tribos ibiapabana. Os combates duraram décadas até o impiedoso extermínio da última tribo. Os primeiros a serem aniquilados foram os Tremembés e por último os Tabajaras. Os poucos sobreviventes viraram escravos e deram origem a civilização mestiça que povoa hoje a Ibiapaba e os sertões do Ceará. E, poucas dessas pessoas sabem, que suas origens estão associadas a uma complexa rede de crimes e de atitudes covardes promovidas há quatro séculos pelos bárbaros europeus que se diziam civilizados e a mando de seu Deus ocidental.Eliminado os nativos, chega os padres da Companhia de Jesus dando início a Missão da Ibiapaba retomando o trabalho abortado pela morte de Francisco Pinto na subida da Serra.
Após o extermínio, a coroa portuguesa dividiu as terras em sesmarias e distribuiu aos colonos que fundaram as vilas de Sobral, Vila Nova del Rei Tamboril, dentre outras.
Texto: José Ribamar Muniz Feitosa - Site Sítio do bosco
“Marróia”: uma ficção alencarina.

Uma feira. Um vendedor de café e bolo entra numa perseguição danada, ao ver seu namoro descoberto pelos irmãos da sua musa. Familiar? Claro que sim. Qualquer novela fala sobre isso desde Shakespeare. Mas a trama simples ainda interessa a jovens criadores que, na frente ou atrás das câmeras, se dispõem a revelar suas próprias abordagens. É o caso do pessoal da escola Tancredo Nunes de Menezes, adolescentes de um projeto pedagógico em Tianguá, na Serra da Ibiapaba.
Perseguição, taí uma imagem que representa bem esse projeto selecionado para o Cine Cufa, dia 14, no Centro Cultural Banco do Brasil do Rio de Janeiro. O Festival Internacional de Cinema e Vídeo este ano abre para produções com mídias móveis — como celulares e as câmeras domésticas de “Marróia”. Uma ficção conduzida pelo professor Natal Portela entre a sede e as comunidades de Lajes e Tianguazinho.
O vídeo resulta do exercício final do Projeto de Iniciação à Produção Audiovisual “A Palavra em Movimento”, desenvolvido pela Associação de Amigos da Arte Garatuja em parceria com a Prefeitura, através da escola de ensino médio. “Era também um projeto sóciocultural, atendendo alunos da escola pública e de periferias da cidade, uma periferia com problemas comuns a qualquer lugar. Todos os atores são da comunidade, a maioria filhos de agricultores, desempregados, donas de casa”, conta Natal.
Trama simples
O vídeo digital, caseiro, com 28 minutos, envolveu moradores que acompanharam as carreiras que o ingênuo Zé do Bolo teve que dar depois que suas cartas de amor foram soletradas pelo ladrão, que trata de dedurar o namoro à família da moça. Arte educador, Natal Portela também mexe com samba e música eletrônica. Mas a trilha que anima a trama popular traz Mundo Livre S/A, Aldo Sena e The Originals.
“A idéia partiu dos meninos mesmo. É um processo coletivo dos alunos, alguns professores e amigos”, diz o diretor, cuja experiência anterior era apenas a de um curso de curtas-metragens, no Cetec de Sobral. “Aprendi a fazer fazendo, como todo mundo”. Deu certo, a população de Tianguá, pelo menos, aprovou. “Começaram a copiar, a gente nem tinha plano de comercializar. Os camelôs vendem a cinco contos”, diz Natal, ressaltando que o grande segredo desta popularidade é o fato de o vídeo ser feito com gente da cidade, na feira e em ruas conhecidas. “Isso é uma alternativa para o audiovisual, mesmo com as dificuldades”.
Limites
Natal se refere inclusive à “ditadura do curta” que estabelece limites para a metragem, que qualificam os 28 minutos de média, prejudicando a difusão, após uma batalha para aprontar tudo, do jeito que dava. “Usamos um microfone e uma câmera só, domésticos”, enfatiza. Mesmo assim, Natal e os demais cineastas de Tianguá aguardam alguns roteiros pré-habilitados em editais da Secretaria de Audiovisual do Minc. Um deles, “Francisca Carla - narrativas de devoção”, segundo Natal, um doc-ficção sobre a religiosidade popular, na década de 50, quando uma portadora de hanseníase foi isolada pela comunidade e virou santa popular. Eles também planejam transformar a Associação Garatuja em um Ponto de Cultura.
“Pretendo mostrar aqui depois. Não foi pro Cine Ceará porque ele não abre pra resoluções baixas”, lamenta Natal. Por enquanto, tem o Cine Cufa, onde devem se apresentar no próximo domingo, dia 14. “Seria importante que as pessoas votassem na gente pelo site www.cinecufa.com.br, pois haverá uma premiação”, convoca. A perseguição continua.
A grande feira do cinema
Até hoje, a melhor expressão da linguagem cearense em vídeo, uma oralidade conhecida como cearensês, talvez seja o impagável “Cine Holiúdy- O Astista contra o Caba do Mal”, ficção de Halder Gomes, com uma estrutura de produção cinematográfica. A trama gira em torno do hábito de assistir a filmes de artes marciais nos pequenos cinemas da periferia da cidade, na época da ditadura militar.
De 2004 e disponível em DVD, o filme abocanhou vários prêmios pelo País e até no exterior, acompanhando a sina internacional de seu realizador, cujo trabalho mais recente está chegando ao mercado de DVD por uma grande distribuidora internacional sob o título de “Cadáveres 2”. Há cerca de uma década, mais exatamente em 1994, tivemos também o exemplo de um documentário, de oito minutos, de Glauber Filho e Tibico Brasil, exibido na Video Mostra Fortaleza, embrião do Cine Ceará: “Borracha para Panela de Pressão”, sobre os camelôs de Fortaleza. E ainda as realizações da produtora Nosso Chão, dos irmãos Ivo e Eliseu de Souza, que marcaram aqueles anos 90 com importantes produções documentais e ficcionais de ambientação local.
Não propriamente por ser uma produção, em vídeo, bastante modesta, mas pela proximidade com o tema abordado, o filme do pessoal da Associação Garatuja, de Tianguá, acabou ficando com a cara de uma cidade do interior cearense. Pelo menos, aquelas que não se curvam diante da sede de mascarar sua própria realidade, em nome de um progresso mais fantasioso do que legítimo. Assim, o próprio uso da expressão-título, “Marróia”, reflete bem o apelo popular do projeto, referindo-se a uma interjeição em bom cearensês, utilizada em algumas situações de surpresas dos personagens.
A movimentação na feira e a dinâmica do protagonista, que desembesta de bicicleta da sua comunidade até a sede, acabam sendo valorizadas pelo diretor Natal Portela. Claro, sem steady-cam, o que faz com que a câmera pule, balance. Há outras deficiências, como o elenco e o áudio. Mas a determinação da moçada por si só merece um prêmio, com o perdão do lugar-comum. Não é todo dia que uma cidade, um Estado, se representa na tela, fugindo aos modelos hegemônicos, pasteurizador de realidades.
“Marróia”, não é que a batida saga de Zé do Bolo tem algo tão arraigado à nossa cultura que já deveria ter virado um filme, com a nossa cara, há mais tempo? Que venham outras feiras do interior, atualizando o pré-cinemanovista baiano Roberto Pires e seu “A Grande Feira”, enquanto as feiras e o próprio desejo de fazer cinema não sucumbem aos super-mercados das imagens.
HENRIQUE NUNES
Repórter
REPORTAGEM: Devastação da Ibiapaba começou na década de 60.

Edilson Silva Diário do Nordeste - Fortaleza (CE) fevereiro 2001
A partir da década de 60, a mata foi intensamente devastada tendo como um dos principais vilões a substituição do café de sombra do Oceano Atlântico, estendendo-se na direção Sul até encontrar os confortes da Serra Negra, no Piauí, e Joaninha no Ceará.
Depois, o café entrou em declínio, prevalecendo a cana-de-açúcar e hortifrutigranjeiros, não havendo recuperação das áreas atingidas. Hoje restam apenas alguns remanescentes de mata úmida, mata atlântica, 'ilhas' fragmentadas em todo o cinturão verde.
Em novembro de 1996, através de decreto federal, foi criada a Área de Proteção Ambiental (APA) da Ibiapaba, com o objetivo de proteger os ecossistemas de mata atlântica, caatinga e cerrado, beneficiando seis municípios do Ceará e vinte do Piauí.Apesar do decreto, a APA da Ibiapaba contempla apenas dois municípios da região - Viçosa do Ceará (100%) e Tianguá (60%). O fato é atribuído a um "lobby" político e econômico, liderado por empresas multinacionais que comercializam agrotóxicos que sentiram a ameaça de perda do mercado, ficando de fora os municípios de São Benedito, Carnaubal, Guaraciaba do Norte, Croatá, Ubajara e Ibiapina.
"Nessa área de proteção o uso de agrotóxicos tem que ser racional, através de receituário agronômico. A partir deste ano, serão feitas campanhas de conscientização dos proprietários rurais e a autuação dos infratores", garante o gerente da APA Sebastião Soares.
O presidente da Fundação Ecológica da Região da Ibiapaba (Funeci), engenheiro-agrônomo Laércio Chiarine, destaca que o município de Guaraciaba do Norte tem grandes áreas devastadas, justamente por concentrar o maior número de hortas, sendo também o maior consumidor de agrotóxico. Depois vem Carnaubal, devido ao terreno arenoso, de carrasco.
Os problemas da APA e do Parque são os mesmos de toda a região da Ibiapaba: uso abusivo de agrotóxicos, queimadas, uso inadequado do solo, falta de um destino adequado do lixo, caça e comércio ilegal de animais silvestres, falta de conscientização ambiental e o mal gerenciamento dos recursos hídricos
O gerente da APA, Sebastião Soares, destaca que muitas nascentes e rios estão desaparecendo, em função do desmatamento das matas ciliares; e muitos rios que eram perenes, hoje são temporários.
Laércio Chiarini, explica que o ideal seria a preservação das matas ciliares com quinze metros de cada lado, para evitar o assoreamento. Enfatiza que a Funeci tem trabalhado para evitar a devastação, mas esta é flagrante em toda a região.
Um dos casos mais graves, na área de recursos hídricos, ocorre com o riacho Ninga, no sitio São José, em Ibiapina, que está poluído e em processo de assoreamento. Na mesma situação, encontram-se os riachos Jaburu, em Ubajara; e Ipuçaba, chegando este último a comprometer a queda d'água da famosa Bica do Ipu.
Órgãos não dispõem de pessoal para fiscalização
A APA da Ibiapaba compreende uma área de 1milhão 592 mil hectares, com abrangência nos municípios de Tianguá, Viçosa do Ceará, Uruoca, Moraújo, Granja e Chaval, além de outras 20 cidades, no Piauí.
A fiscalização no Piauí tem como base o pessoal do Parque de Sete Cidades. No Ceará é feita com apoio do Parque Nacional de Ubajara, que, por sua vez, dispõe somente de um agente de defesa florestal. O gerente do Parque Nacional de Ubajara, Emanuel Barreto, enfatiza que o Ibama está destinando quatro fiscais para a APA e mais quatro para o Parque, o que vai melhorar a eficiência deste tipo de trabalho.
"Em função do reduzido número de funcionários, a fiscalização é feita através das denúncias que chegam freqüentemente ao Ibama. A meta é atender a todos que nos procuram, mas nem sempre é possível. Há um plano da Secretaria de Segurança Pública e Defesa da Cidadania do Ceará, de implantar um pelotão da Companhia de Polícia Ambiental (CPMA) na região", destaca.
Emanuel Barreto acrescenta que as gerências da APA e do Parque iniciaram em 2000 a implantação de um projeto de educação ambiental na rede municipal de ensino, em parceria com as Prefeituras, capacitando diretores e professores, como forma de conseguir uma maior adesão da comunidade na preservação do meio ambiente.
Com isso, já foram atendidos Viçosa do Ceará, Ibiapina, Ubajara e Tianguá. O gerente da APA, Sebastião Soares, coloca, por sua vez, que também está sendo feito a articulação com os municípios para a implantação de Conselhos Municipais de Defesa do Meio Ambiente.
Proprietários rurais com áreas ainda bem conservadas, estão sendo incentivados a criar Reservas Particulares do Patrimônio Natural (RPPN), sendo que a Cachoeira da Floresta, de propriedade do Hotel Serra Grande, deverá ser a primeira RPPN da Ibiapaba. A Funeci também trabalha na área de preservação, propondo a criação de Parques Municipais.
Região tem potencial para a agricultura
Em função do clima, que não apresenta os parâmetros típicos do semi-árido, e da ocorrência de solos de boa aptidão agrícola, a Ibiapaba constitui-se numa zona de grande potencialidade econômica do estado do Ceará. O movimento de hortigranjeiros, em 2000, no Mercado do Produtor - Mepro, localizado em Tianguá, somou 43.109,6 toneladas, apresentando um substancial crescimento em relação a 1999, com uma receita total de R$ 215.634,65.
As principais culturas comercializadas foram o tomate e o maracujá, com destaque para os municípios de Tianguá e Ubajara. A região vem sendo procurada, no momento, para a introdução de culturas nobres, destacando-se o plantio de rosas em Inhuçu, São Benedito,através de uma empresa gaúcha. Holandeses e japoneses mostram-se igualmente interessados nesta atividade econômica.
A experiência de Inhuçu é um projeto piloto para produção em escala comercial para o Brasil e o mercado exterior.
A expectativa, segundo informações da Secretaria de Agricultura Irrigada, que apoia o projeto, é de que sejam produzidas 200 rosas por metro quadrado. A produtividade é bem superior a alcançada pelos colombianos (90 rosas/m²) e até a do maior produtor nacional (150 rosas/m²).
O plantio inicial é de 1,2 hectares, mas o projeto total contempla uma área de 20 hectares. Outros investimentos estão sendo implementados na região, com destaque para Guaraciaba do Norte, com a agricultura orgânica, o cultivo de hortaliças sem o uso de agrotóxicos; o café ecológico; e a instalação de fábrica de uma empresa americana, em Tianguá, para beneficiamento da acerola.
Em meio a este quadro de mudanças, vale destacar a resistência dos engenhos na produção de cachaça e de rapadura em 'tijolo', como a que é produzida em Ibiapina, no sítio São José dos Caboclos, onde 'seu' Chico Cesário produz quinze cargas por dia, cada uma com trinta quilos ao preço de R$ 20,00. Ele reclama do lucro, que considera dos mais baixos, mas explica que tem vinte anos neste setor "e ninguém pode viver sem trabalhar".
Mesmo com todos os atrativos naturais, o fluxo turístico na Ibiapaba não é considerado dos melhores. O empresário Antônio Valdir Araújo, Pousada Inhuçu, em São Benedito, destaca que a movimentação ocorre apenas nos meses de janeiro e julho, carnaval, semana santa e feriados prolongados, ficando hotéis e pousadas praticamente vazios nos demais meses.
"A rede hoteleira da Ibiapaba vive da alta estação. Os turistas reclamam das péssimas condições da BR 222, no acesso de Fortaleza para Tianguá", coloca Araújo, acrescentando que a Pousada tem uma atração a mais, que é a cerração, o frio nas noites de inverno, quando a temperatura chega 15 e 16 graus."Tem gente que levanta às 5 horas da manhã para ver a cerração, tudo fica fechado, sendo preciso o uso de agasalhos. Depois de Guaraciaba do Norte, que fica a 940 metros de altitude, vem Inhuçu com 898 metros. São os dois locais mais frios da Ibiapaba, com uma temperatura média de 21 graus", enfatiza Antônio Valdir.
A Ibiapaba guarda atrativos turísticos em todos os municípios, com trilhas e cachoeiras, com destaque para o Parque Nacional de Ubajara que, por sua vez, tem como atração a gruta formada por calcário moldado pelas águas subterrâneas. A gruta possui 1.120 metros de extensão, dos quais 420 estão iluminados artificialmente e abertos à visitação. No Parque também existem outras belezas como a cachoeira do Cafundó, no riacho Bela Vista; o Rio das Minas, com poços para banhos; o Centro de Visitantes, com biblioteca e sala de vídeo, exposição permanente com fotos e informações e a Gruta do Urso Fóssil, de apenas 130 metros, com fósseis de animais encontrados em seu interior.
Colheita de idéias
24/09/2008
É do semi-árido que um grupo de artesãos cearenses reinventa sua história. a partir do croá, uma fibra típica da região, esquecida por muitos anos, eles passaram a produzir objetos de decoração
Uma vegetação que até pouco tempo se resumia numa espécie típica do semi-árido. Utilidade? Só no passado, quando a fibra, denominada de croá, era transformada em corda para amarrar animais e pés de plantações. Durante muitos anos não passou disso. Agora, essa planta ganha status de matéria-prima e entra na produção de artesanato desenvolvido no município cearense de Tianguá.
A partir do croá surgem peças utilitárias e decorativas, a exemplo dos revisteiros, fruteiras, poltronas, mesas e luminárias. O material pode ser rústico, mas o design é bem moderno. O trabalho tem assinatura do Grupo de Artesãos Flor do Croá, do Distrito de Pindoguaba.
São 50 pessoas, entre homens e mulheres, atuando nesse projeto de iniciativa do Sebrae em parceria com o Governo do Estado do Ceará e a Prefeitura Municipal de Tianguá. Até o momento, não se conhece outra região do Estado que utilize essa mesma matéria-prima no artesanato.
A fibra do croá é considerada a prima do sisal, por sua semelhança. O preparo do material para a produção não tem mistério. Após a colheita da planta, são removidas as folhas verdes e os espinhos aproveitando-se somente o caule. Depois, um dia de sol intenso para fazer a secagem e algumas batidas no chão para amaciá-la. Assim, a fibra de croá está pronta para virar objeto de uso, destacando ainda a sua resistência.
Usada de forma natural, o único diferencial do croá são as formas que ele ganha nos objetos, muitas vezes com estrutura em madeira ou ferro. O toque de modernidade pode ser conferido nas mesas com tampos de vidro. Em alguns produtos os artesãos acrescentam palha de coqueiro ou fio de algodão, proporcionando diferentes tramas.
Segundo a gestora do projeto, desenvolvido pelo Sebrae, Lucileide Lourenço de Oliveira, até pouco tempo esta planta, típica da região e que brota em meio às pedras, era extraída com a raiz. Agora, para garantir a sua reprodução, são cortadas de forma diferente. Desde então, o artesanato com a fibra de croá ganhou corpo e visibilidade. Com isso, o grupo de artesãos Flor do Croá deseja alterar a face de uma região problemática, quase sempre excluída dos programas direcionados para o desenvolvimento.
Antes de descobrir as possibilidades do croá, Maria do Carmo da Silva, 27 anos, já desenvolvia habilidades manuais. Fazia porta-retratos e caixas de madeira com as sobras de compensados, lembrancinhas de casamento, aniversário, enfim estava sempre inventando. Há um ano e meio, Carminha, como é conhecida, passou a trabalhar com croá, um material que já fazia parte da sua história, mas nunca tinha percebido o seu valor.
Quando criança, o pai de Carminha já utilizava a planta, porém, só tinha uma função: amarrar animais e os pés de plantação. A fibra, que antes não passava de uma simples corda, hoje virou fonte de inspiração e renda para a artesã e sua família.
Negócio próprio
Ao lado do marido, a artesã também está investindo num negócio próprio. Detalhe: a decoração é feita de croá. “Lá servimos bebida e comida caseira, tudo bem simples, mas a gente já aproveita para exibir o nosso trabalho artesanal”, diz.
Todas as tardes, depois de preparar as tarefas domésticas, Carminha se dedica ao artesanato. Além de cordinhas finas, faz brincos, chaveiros e ainda atua na coordenação do grupo. Tudo é controlado, a produção, os gastos e o lucro. Em média, ela consegue ganhar por volta de R$ 70,00 ao mês. “O valor pode parecer pouco, mas já é um bom começo para quem não tinha nenhuma renda”, justifica satisfeita.
Artesã pioneira
Mãe solteira, de gêmeos, Lucilene Maria da Silva, 35 anos, tem o maior amor pelos filhos. Seu sonho é fazer um curso de culinária, pois adora cozinhar, mas enquanto isto não acontece, dedica-se ao croá. Aliás, foi a primeira artesã a desenvolver trabalhos com a fibra. Para ganhar uns trocados extras, faz caldo e churrasquinho. Afinal, o que ganha com o artesanato ainda é pouco, porém, o suficiente para ser feliz e continuar sonhando.
Um dos desejos de Lucilene é desenvolver roupas com o croá. Segundo ela, a fibra é muito macia e se parece com o algodão. “Quanto mais tempo ela passa no sol, mais branquinha fica”, explica. É a partir desses conhecimentos que a imaginação de Lucilene vai cada vez mais longe. Por enquanto, suas criações se restringem à peça decorativa e de mobiliário. Elas ficam expostas numa espécie de showroom que Lucilene costuma brincar: “esta é a nossa Casa Cor”.
Tudo é feito com muito carinho. As paredes também receberam tinta colorida. O material adquirido e até as viagens dos artesãos para as feiras têm uma prestação de contas. “A gente tem sempre que pensar e olhar para a frente”, diz.
FIQUE POR DENTRO
Uma riqueza colhida no semi-árido
O trabalho com a fibra do croá remonta uma prática muita antiga, realizada pelos moradores de Pindoguaba, distrito de Tianguá, interior do Ceará. Como forma de suprir necessidades, a partir dessa vegetação eram feitos trançados de corda e mantas de animais para serem vendidos na feira. Também eram produzidas redes de dormir. Com o passar do tempo e o advento da corda industrializada, perdeu-se o sentido de dar continuidade à prática da corda de croá. Porém, a comunidade não parou por aí, passou a reinventar formas de aproveitamento dessa matéria-prima. Criou-se assim uma variada morfologia entre as culturas e a interação dos moradores com outros meios produtivos. Agora, por meio de uma associação, os artesãos produzem peças com design moderno e valor agregado.
CRISTINA PIONER
Redatora Diário do Nordeste

